7.9.08

o q se deseja, se foi inventado


(...)nosso desejo é o fruto volúvel das ocasiões, das circunstâncias e, sobretudo, das relações com nossos semelhantes; ele é uma disposição que INVENTAMOS -não que DESCOBRIMOS.(...)
em vez de desejar de galho em galho segundo as ocasiões e conforme nossas aptidões, preferimos almejar o impossível (..)

caligaris, num artigo q tá por aí. ele é psicanalista..


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prólogo do livro a cruz de genio:
- Pensa nisto: há cerca de quinhentos mil anos o Homem temeu, observou, manipulou e, por fim, passou a amar o fogo. A incompreensão e o medo evoluíram para fascinação e dependência. A simplicidade da vida foi preenchida pela sede da descoberta. A vida e a morte dissociaram-se, surgindo o sentido da vida e a justificação da morte. Ao acto de dormir, caçar, procriar e comer foram acrescentados o pensar e construir, o amar e odiar. O Homem não mais parou. Atravessou civilizações, culturas e pensamentos germinando sementes de inconformismo.
- Continua.
- Até hoje, nas guerras os homens avançaram e tombaram, só alguns ou todos; as epidemias dizimaram populações; as catástrofes interromperam abruptamente o percurso até dos mais resistentes; as missões de trabalho contaram com baixas; o quotidiano trouxe a morte. Enfim, todos nasceram a saber que morreriam. E essa morte seria sempre inesperada e de um momento para o outro.
- Não, nem todos. Os génios e os loucos enfrentaram a percepção dessa fatalidade, multiplicando cada segundo na Terra, dando largas á sua criatividade, camuflando a sua perenidade. Em desespero ou em delírio procuraram a eternidade, um sentido razoável ou simplesmente a conformação face á evidência, sempre procurando tornar tolerável a tomada de consciência do desvio que a Natureza lhes pregou. O raciocínio e a clarividência transformaram-se numa cruz. A inteligência logrou vencer os desafios terrenos mas a intelectualidade condenou-o a ver-se como um nada, sem destino e sem Deus.
- Precisamente. A loucura é provavelmente tão antiga como a própria raça humana. Os arqueólogos encontraram crâneos com pelo menos cinco mil anos que apresentam orifícios feitos com ferramentas perfurantes. A explicação reside provavelmente no facto de os loucos e epilépticos serem vistos na antiguidade como pessoas possuídas por espíritos malignos, podendo assim os demónios escapar pelos buracos.
- Sim. Perante a evidência da morte e a consequente aceitação do desfecho inevitável, a quebra das regras e a não continuação do jogo, surgem aos ‘iluminados’ como um problema menor, ou mesmo um não problema. O que têm a perder quando sentem que não podem ganhar? Os que resistem ao abismo, intentam por ladeiras escorregadias onde a fonte de equilíbrio são alguns sopros que devidamente doseados proporcionam ainda invulgar prazer. Sem sentido de vida, mas com sentido de aproveitamento de vida. Desde que a corda, esticada ao extremo, o permita.
- Entendo. Só os loucos vencem porquanto na sua visão livre foram poupados ao espartilho. Mas a crença de que os loucos eram obra do demónio evoluiu, chegando a religião cristã a distinguir entre loucos bons, portadores de uma inocência divina, e os loucos maus instrumentos do demo. Entre os bons contam-se os artistas, indivíduos normalmente despegados dos valores terrenos como o dinheiro, possuidores de uma imaginação prodigiosa, podendo ver coisas que mais ninguém vê. O génio e o louco passam a ser vistos lado a lado e parte-se em busca da misteriosa ligação entre os indivíduos altamente criativos e aqueles com distúrbios mentais, como os maníaco-depressivos.
- Bela idade a da pedra...