22.9.08

sob a mesma lua


Matias Aires in Reflexões sobre a vaidade do homem



Só a vaidade sabe dar existência às coisas que a não têm, e nos faz idólatras de uns nadas, que não têm mais corpo que o que recebem do nosso modo de entender, e nos induz a buscarmos esses mesmos nadas, como meios de nos distinguir; sendo q nem "Deus", nem a natureza nos distinguiu nunca. Na lei universal ninguém ficou isento da dor, nem da tristeza: todos nascem sujeitos ao mesmo princípio, que é a vida, e ao mesmo fim, que é a morte; a todos compreende o efeito dos elementos; todos sentem ardor do sol, e o rigor do frio; a fome e a sede, o gosto e a pena, são comuns a tudo que respira: o "Autor" do mundo fez ao homem sobre uma mesma idéia uniforme, e igual, e na ordem com que dispôs a natureza não conheceu exceções, nem privilégios: nunca o homem pode ser mais nem menos do que homem; e por mais que a vaidade lhe esteja sugerindo uns certos atributos, ou certas qualidades, que o fazem parecer maior, e mais considerável, que os mais homens, essas mesmas qualidades, ainda sendo verdadeiras, sempre são imaginárias; porque também há verdades fantásticas, e compostas somente de ilusões.